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segunda-feira, 28 de março de 2011

Filtros processuais não impedem início de ações, diz ministro Carvalhido

O minstro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Hamilton Carvalhido concedeu entrevista à revista Consultor Jurídico, publicada nesta segunda-feira (28). Nela, o magistrado fala sobre a Lei da Ficha Limpa, reforma do Código Eleitoral e a necessidade de enfrentamento das demandas de massa. Confira a íntegra da entrevista feita por Alessandro Cristo, editor da revista.

Entre a função de comandar os programas de organização dos tribunais brasileiros e a de julgar as eleições presidenciais de 2010, o ministro Hamilton Carvalhido escolheu a segunda. Era sua a prerrogativa de ser corregedor nacional de Justiça, mas ele optou pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). E não se arrepende. Foi dele a incumbência de julgar primeiro os argumentos sobre a validade da Lei da Ficha Limpa já em 2010, ano em que foi sancionada.

Respondendo a uma consulta no TSE, o ministro considerou que a norma não alterou o processo eleitoral, e por isso não precisaria esperar um ano para começar a valer. Na última quarta-feira (23), Carvalhido viu sua posição ficar vencida no Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou a norma inválida para o ano de seu nascimento. O resultado apertadíssimo foi de seis votos a cinco e dependia apenas da nomeação do ministro Luiz Fux para a Corte.

Prestes a se aposentar — o que acontecerá compulsoriamente em maio, depois de quase 50 anos dedicados à carreira jurídica —, Carvalhido apenas começou a dar sua contribuição na área eleitoral. Ele faz parte da comissão que hoje avalia a reforma do Código Eleitoral, grupo organizado pelo Senado em julho do ano passado e coordenado pelo ministro Dias Toffoli do STF. Um dos temas principais a serem atacados, segundo ele, é a forma de financiamento de campanhas eleitorais, que em sua opinião não deveria mais ser mais feito por pessoas jurídicas, que afinal não votam. "Seria melhor limitarmos as doações às feitas por pessoas físicas", diz.

Carvalhido foi o primeiro corregedor da Justiça Federal, cargo que ocupou entre 2008 e 2009, tempo em que implantou a Corregedoria. Simultaneamente, foi presidente da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, órgão responsável pelo alinhamento da jurisprudência esparsa dos Juizados Especiais Federais de todo o país.

Experimentado no enfrentamento da demanda em massa de processos, o ministro alerta que os filtros criados no STJ e no STF para diminuir a subida de recursos, como a Lei de Recursos Repetitivos e a Repercussão Geral, não têm a função de estancar novas ações. "Ainda que agilizem as soluções, esses instrumentos não podem ser vistos como algo que neutralize o caudal de processos, e sim como consolidação de um entendimento que deve regrar as relações da vida social."

Ministro do STJ desde 1999, oriundo do quinto constitucional do Ministério Público, o carioca Hamilton Carvalhido passou por duas Seções da Corte. Professor de Direito Penal, começou na Terceira Seção, que julga apenas recursos criminais. Nesse período, coordenou a comissão organizada pelo Senado para a reforma do Código de Processo Penal. Em 2008, mudou para a Primeira Seção, de Direito Público. Foi autor de uma das primeiras decisões que admitiu a aplicação da Lei Geral de Greve, reservada aos empregados da iniciativa privada, às paralisações dos servidores públicos. A falta de uma regra específica para os funcionários estatutários levou o STF a tomar a mesma medida, e declarar válido o uso da norma para estes casos.

O ministro recebeu a revista Consultor Jurídico em seu gabinete no STJ para uma entrevista. Os principais trechos da conversa, que aconteceu antes da decisão do STF sobre a Lei da Ficha Limpa, o leitor poderá conferir abaixo.

ConJur — Quando o ministro saiu do Conselho da Justiça Federal, teve a opção de ir para o Conselho Nacional de Justiça como corregedor. Por que preferiu o TSE?
Hamilton Carvalhido — Eu já tinha dado a minha contribuição como corregedor da Justiça Federal. Na carreira da gente, não se pode deixar de passar por um tribunal superior como o TSE. São 20 anos de eleições. No Conselho da Justiça Federal, eu fui o primeiro corregedor, implantei a Corregedoria. Nesse período, acumulei a Presidência da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais. Terminado o mandato lá, eu tinha a opção, devido ao critério de antiguidade no STJ, de ser corregedor nacional de Justiça ou ir para o Tribunal Superior Eleitoral como titular. Optei pelo TSE, e a ministra Eliana Calmon foi para o CNJ. Para a minha carreira, o TSE veio na hora exata. É o lugar certo para o magistrado quando ele adquire um determinado grau de experiência, de vivência.

ConJur — O que significou entrar no TSE em um ano peculiar como esse?
Hamilton Carvalhido — Foi importante não só pela eleição, mas também pela votação da Lei da Ficha Limpa. Fui eu quem respondeu à primeira consulta sobre a aplicabilidade da lei. Foi o que mais me entusiasmou. Minha decisão foi assentada em fundamento jurídico, e não em fundamento estranho ao Direito. Muito embora a gente fique muito contente quando o Direito, como é de sua natureza, se encontra com aquilo que a sociedade reclama. A regra deve ser sempre essa: o Direito deve responder a um anseio social. 

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